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Crítica para um Filme que Jamais Existirá: Film Annonce Du Film Qui N'Existera Jamais:«Drôles De Guerres » (2023) Por Jean Luc Godard

Cineasta e crítico do Cahiers du Cinéma, Jean Luc Godard nasceu na França em 1920. Foi um dos fundadores do movimento da Nouvelle Vague, criando uma linguagem autoral e junto com cineastas como François Truffaut e Alain Resnais, buscou quebrar os paradigmas de um cinema hegemônico hollywoodiano. Em defesa da colagem e fragmentação, esses cineastas buscaram a não linearidade, cortes bruscos e experimentações, uma nova forma de se fazer cinema, criando formas de quebrar com os cânones do cinema hegemônico hollywoodiano da época. 

Na produção de Film annonce du film qui n'existera jamais: «Drôles de guerres» (Anúncio para um Filme que Jamais Existirá - Phony Wars - 2023), adaptado do livro (seria uma releitura?) do livro com o mesmo nome. É um dos últimos filmes do diretor que foi lançado postumamente, e que obteve para o mesmo uma homenagem a Cannes em 2003. Film annonce du film qui n'existera jamais na realidade se configura como um trailer, que prometia nunca ter um filme, que anos depois seria descoberto pelo público a obra realizada. 

Mas adentrando-se nele, o trailer reúne esboços e ideias do autor em 20 minutos de reflexões, metáforas e metamorfoses linguísticas em meio ao caos de imagens e sons que culminam para uma reflexão sobre o que é o cinema. O ponto de interesse neste filme, que na realidade foi um trailer, como já mencionado, é como o próprio título já diz: “um filme que nunca existiu”. Essa configuração fala mais sobre quem é Jean Luc Godard, e sua mente criativa para "desvirtuar-se" dos paradigmas impostos sobre o universo cinematográfico. 

Buscando nas ferramentas cinematográficas, modos de atuação que criam novos significados a partir de ideias já existentes. Como a própria definição de trailer, que se fossemos pesquisar no dicionário, define-se como: montagem constituída de curtos excertos de filme, novela, programa etc., e exibida, como anúncio, antes do lançamento. Mas aqui, Godard coloca o trailer como esse corpus que possui sua existência materializada por meio de algo que em tese jamais existiu, o filme mas que irá se materializar tempos depois e se tornar algo totalmente novo e desconexo do seu dito trailer. 


 

Entrando na forma fílmica, Film annonce du film qui n'existera jamais: «Drôles de guerres» foi organizando no próprio papel fílmico, com colagens, escritas e intervenções na tela que a partir de planos longos e contemplativos de obras estáticas e colagem, propiciam o espectador a uma nova interpretação de algo já existente. Assim como Godard faz com a própria ideia do filme e de modo geral, foi o que buscou em toda a sua carreira, transformar algo já existente, o cinema, em algo novo e orgânico, aberto a interpretações. 

O próprio diretor, dentro de seus trabalhos e nas produções críticas que desenvolveu ao longo da carreira, argumenta que: “pensar na mise-en-scène é pensar na montagem”, identificamos nessa frase godardiana, dentro do ‘trailer que jamais existiu’, que a operacionalidade e o pensar em cada plano, frase, som e como eles se operam dentro deste filme, estão correlacionados com a forma como ele escolheu dispor esses elementos em tela, e a forma como cada um deles é organizado e pensado para fazer parte de um todo. Um exemplo disso é o uso da palavra, que possui uma força sendo exercida dentro da montagem, que assume o papel de legenda, voz, colagem, poemas, etc. Essas palavras se tornam enigmas ao deixarem de possuir um significado em si, e trabalham no conjunto da obra, abrindo espaço para diversas interpretações. 


 

Film annonce du film qui n'existera jamais: «Drôles de guerres» é um filme complexo, assim como o próprio realizador. Seu surgimento no mundo já se consagra como uma intervenção na ordem das produções cinematográficas, e suas interpretações se esvaziam pela falta de um norteamento, mas se enchem ao pensarmos que o significado de um filme é materializado na visão do espectador. Então, como alguém que esteve em contato com a obra, tais interpelações também dão margem à reflexão de que estamos em uma galeria de arte, mas que nesses 20 minutos somos forçados a ver a exposição na ordem e no tempo do diretor. Das reflexões que me interessam, seria esse um filme sobre a guerra? Sobre a arte? Guerra e arte, seria a representação da guerra algo de se apreciar em uma galeria?



Julia Oliveira


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